segunda-feira, 21 de abril de 2008

Falta de base familiar agrava a violência

Ruan foi baleado por um garoto cujo pai foi morto a tiros pela polícia
Helga Cirino, do A Tarde
>> Ciclo que gera violência pode ser obstruído >> Amigos de Ruan Sérgio marcham pedindo paz >> Os meninos que passam por aqui ficam órfãos com os pais ainda vivos”
O olhar confiante é do menino de 13 anos que matou a tiros Ruan Sérgio da Silva, 16 anos, na última segunda-feira, 14, na porta do Colégio Adventista, na Cidade Baixa. O motivo do crime foi uma discussão entre adolescentes, segundo ele, “por uma rixa envolvendo paquera”. Acompanhado pela mãe e por dois advogados, o garoto alto e forte, apesar da pouca idade, foi apreendido e levado à Delegacia para o Adolescente Infrator (DAI), onde não demonstrou qualquer ressentimento de ter praticado o assassinato do colega.O caso trouxe à tona a questão sobre o motivo de meninos tão jovens serem capazes de praticarem atos de extrema violência, como tirar a vida de um outro garoto. A verdade é que esse adolescente de 13 anos não foge à regra do perfil da maioria dos jovens que passam pela Delegacia para o Adolescente Infrator: são filhos de famílias desestruturadas, que reproduzem a violência personalizada, na maioria das vezes, pela figura paterna, sejam pais vítimas de assassinatos, presos ou foragidos pela prática de diversos tipos de crime.O menino de 13 anos que matou Ruan Sérgio com dois tiros não chegou a conviver com o pai. “Ele morreu há cerca de dez anos, depois de um confronto com a polícia”, explicou a delegada titular da DAI, Claudenice Cerqueira Teixeira Mayo. Helimar de Jesus Figueiredo tinha passagens em delegacias por roubo a banco, inclusive em unidades do Estado de Pernambuco.O chefe do Serviço de Investigação da Delegacia para o Adolescente Infrator, Washington Costa, confirmou a tendência de boa parte dos adolescentes que passam pela unidade, de possuírem histórico semelhante.“Noventa por cento dos adolescentes que passam por aqui não têm a presença paterna na vida deles. São vítimas da desestruturação familiar”, analisou o chefe do Serviço de Investigação, que, além de policial, é sociólogo de formação e realiza palestras sobre o tema em universidades e outras instituições.A experiência de Washington Costa é empírica – não existem números que confirmem a informação. Mas basta passar um dia na unidade para verificar que esse perfil de jovens é muito comum. Na última sexta-feira, 18, o menino de 13 anos não foi o único a passar por aquela unidade com essas características.FURTO – Um outro garoto de 15 anos, que foi apreendido depois de praticar um furto, tem história semelhante. “Meu pai não me registrou. Minha mãe me disse que ele tinha sido preso quando eu ainda era criança”, contou o menino, cabisbaixo.Outros dois, dos cinco adolescentes que passaram pela unidade, jamais tiveram contato com os pais: um tinha pai desconhecido e o pai do outro cumpre pena por crimes.A psicóloga Maria Soares Brito, especialista em atendimento a crianças e adolescentes, confirma que a falta de estrutura familiar “é o principal motivo do envolvimento de jovens com atos infracionais. E se os pais desses adolescentes são envolvidos com crimes, e são os responsáveis pela educação dos meninos, é quase impossível que eles não se envolvam também em delitos”, disse a especialista.PADRÕES – A psicóloga Maria Brito explicou que os jovens tendem a repetir os padrões morais dos pais e respeitam os limites impostos por esses. “Os conceitos éticos, morais, aqueles básicos do que é certo e errado, têm que ser afirmados e reafirmados sempre pelos pais”, analisou. Maria Brito também explicou que a fase entre 10 e 17 anos é muito especial para a formação dos jovens para a idade adulta e requer um cuidado especial.“Eles precisam de muito aparato familiar, estrutura, para que não saiam por aí adotando valores equivocados. Para ser pai não é necessário só ter filhos, mas também criá-los, dar educação, impor limites e ensinar valores”.

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