sábado, 14 de junho de 2008

14.590 jovens com pais ignorados

Por Lilian Machado
No registro civil de Manoela, 14 anos, os dados de seu nascimento aparecem incompletos. A ausência do nome do pai é uma constante lacuna que ultrapassa o papel e deixa um vazio em sua história de vida. O caso da adolescente reflete uma realidade muito comum a milhares de pessoas que não têm a denominação do genitor no documento de certidão. Somente nas escolas da rede municipal e estadual de Salvador existem 14.590 crianças e adolescentes com o nome do pai ignorado.
O Ministério Público Estadual (MP-BA), através do Núcleo de Paternidade Responsável (Nupar) tem buscado amenizar essa problemática. Entre os anos de 2005 e 2007, o Projeto já conseguiu o reconhecimento de paternidade de 16.181 crianças e adolescentes. O assunto foi discutido ontem na sede do MP, em Nazaré, durante um evento direcionado aos gestores de escolas da rede pública de ensino da capital.
“É impossível não ligar a questão da ausência paterna com o fracasso escolar. A maioria dos problemas relacionados a educação estão associados a dilaceração familiar. Na escola onde trabalho, dificilmente vemos uma família com a estrutura de pai, mãe e filho morando em uma mesma casa. Além disso, existem aqueles que nunca vão ter a chance do reconhecimento paterno no documento, pois já perderam seus pais em situação de violência”, enfatiza a professora e diretora do Centro Municipal de Educação Infantil, em Cosme de Farias. Ela lembra que esse é um caso freqüente nas escolas das comunidades de baixa renda de Salvador.
De acordo com o promotor do MP, Lidivaldo Brito, o Projeto de Reconhecimento de Paternidade é importante para sensibilizar os pais “a esse direito inalienável das crianças e adolescentes” de possuírem o nome do pai no documento civil. O programa funciona através de uma parceria com as Secretarias Estadual e Municipal de Educação que, após o prazo de finalização das matrículas enviam a relação dos alunos com paternidade ignorada para o órgão.
O promotor explica que, a partir da listagem em poder do MP, a ação do órgão consiste em ouvir as mães e os supostos pais à respeito da paternidade. Em seguida, é providenciado o reconhecimento espontâneo. “É feito um trabalho de conscientização e se o pai tiver dúvidas poderá fazer o exame de DNA. Se houver ainda uma resistência para o reconhecimento e a realização do exame, o MP entra com uma ação de investigação de paternidade, que trata-se de um processo judicial, onde são observados outros tipos de provas”, esclarece.
O exame de DNA é realizado através de um convênio com o laboratório do Grupo de Apoio a Crianças com Câncer (Gacc) que cobra R$250 pelo teste, sendo que o valor pode ser parcelado. Os pais que moram no interior são também atendidos pela Promotoria de Justiça de cada município. Nos casos de exame de DNA, o próprio órgão providencia a coleta da saliva da pessoa, guarda em uma caixa acondicionada e encaminha para o Gacc na capital.
Ano passado foram realizados 6.380 reconhecimentos, 2.674 análises de DNA e foram geradas 1.988 ações de investigações de paternidade em toda a Bahia. Quando o pai é encontrado e aceita a intervenção, o prazo para o término de todo o processo acontece em 60 dias. No entanto, quando a questão passa para ação de investigação, o prazo pode durar até três anos.
Conforme, a coordenadora do Nupar, promotora de Justiça, Ana Paula Bacelar Bittencourt, há o impacto social grande, pois a partir do momento que a criança e ou o adolescente tem a figura do pai no documento, ela poderá cobrar afeição e estrutura material. Além do reconhecimento paterno, o nome no registro civil assegura o acordo para a alimentação do jovem.

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